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quinta-feira, 30 de maio de 2013

Sobre a palestra "Educação, Modernidade e Pós-Modernidade"

Walner Mamede


    


    

Nos dias 23 e 24/05/2013, como pode ser aduzido do vídeo acima, localizado em https://youtu.be/jWmZKHgOjrE?t=39m39s e cujas referências de tempo, para localização do debate, são citadas entre parênteses, teve lugar na Faculdade de Educação da UnB o "Ciclo de Estudos sobre Educação, Modernidade e Pós-Modernidade", em que se apresentou o Prof. Newton Duarte, da UNESP, trazendo suas contribuições para a construção de uma Pedagogia crítica segundo a visão marxista sobre a questão. Infelizmente, em que pesem seus pontos positivos, o formato de "colóquio" não permite um debate de fato, apenas abre espaço para o palestrante expressar suas ideias e o plenário manifestar algumas opiniões ou questões, sem o direito à tréplica, o que limita o aprofundamento do debate ou esclarecimento sobre as questões postas, anteriormente. Em suas respostas (0:58:56 à 1:16:15) ao meu posicionamento (0:39:41 à 0:46:15), Newton Duarte parece não ter compreendido bem o que coloquei, por falha minha, talvez, ou por incomensurabilidade paradigmática, ao ponto de correlacionar minhas discordâncias com a mera incompreensão de sua exposição. Ao abordar o tema do dogmatismo aparente de sua postura, afirmou não ser adequado levar o debate para o âmbito pessoal, por significar uma fuga da discussão teórica, advogando ser isso um indicador de meu próprio dogmatismo e desconhecimento da teoria marxista, dada minha defesa irrefletida de uma posição pós-moderna. A intenção de minha afirmativa foi – como ele próprio indicou momentos antes ao justificar sua performance incisiva e categórica como palestrante – gerar desconforto e provocar uma reflexão sua acerca de tal postura, uma vez que ela tem demonstrado ser mais prejudicial que benéfica quando reproduzida no interior de escolas, lá sim muitas vezes de forma dogmática, talvez, pela pouca profundidade teórica de quem assim o faz e pela reverência irrefletida a posturas e ideias de pensadores como o Prof. Newton Duarte. Em sua defesa, Newton Duarte alega, ainda, não ser dogmático, mas sim ortodoxo. A palavra vem do grego "orthós" (reto) e "dóxa" (opinião), designando aquele que crê como verdadeira uma norma ou um dogma pré-estabelecidos e que emite sua opinião como sendo a correta. Fica no ar a resposta para a pergunta: ainda que se possam aventar outras significações para o termo, fundamentadas teoricamente, inclusive, não seriam tais significações apenas um recurso ‘ad hoc’ e retórico para se dissimular um dogmatismo sob mantos menos ásperos? Contudo, concordo com ele quando diz que o Marxismo não é dogmático, sendo dogmáticos alguns marxistas. Além disso, ele ser ou não dogmático não inviabiliza a teoria, apenas a alça a um status de res veredicta incompatível com uma postura científica. Exemplo disso é o fato de, logo em seguida, afirmar, condescendentemente, que a teoria freireana deve ser valorizada por sua contribuição histórica, mas que suas limitações fenomenológicas e cristãs a impedem de ser considerada como uma pedagogia, verdadeiramente, crítica, ao nível do que faz o Marxismo. Contudo, há de se lembrar que o pensamento freireano foi profundamente influenciado pelas teorias marxistas após o exílio de Freire e que, independentemente de sua origem fenomenológica cristã, a proposta de se partir das hipóteses explicativas do aluno, para questões cotidianas, caminhando na direção dos aspectos mais amplos, abstratos e teóricos que envolvem tal questão, a fim de melhor compreendê-la, retornando ao nível local imediato de vivência do aluno, para que reelabore seu entendimento sobre a questão original e atue sobre ela, concretamente, no sentido de superá-la em direção à construção coletiva de uma sociedade mais justa é, no mínimo, revolucionário! E não cabe aqui afirmar uma negligência com os conteúdos escolares formais, pois que estes são a própria ferramenta do aluno na lida com a questão discutida e com a superação do problema social aventado por ela, durante todo o processo educativo. Assim, o problema social que se torna tema das aulas é extraído da própria realidade do aluno, segundo sua própria visão sobre ele (ponto de partida) em direção ao que seria uma compreensão muito mais elaborada (ponto de chegada), resultando, na pior das hipóteses, em uma síntese entre os dois extremos, que possibilita uma ação concreta sobre a realidade social. Evidentemente, precisamos reconhecer que o ‘ponto de chegada’ pode ser relativizado segundo a perspectiva teórica do grupo de professores que estrutura o processo, mas, na perspectiva freireana, a proposta é de crítica contumaz ao sistema, a partir do ataque às próprias estruturas de pensamento do aluno, suas premissas e pressupostos (presentes em sua hipótese explicativa), e não informando o “o que” e “como” ele deve pensar e agir, nem apenas apresentando pontos de vistas do professor sobre um problema social, também, por este selecionado. Com Freire, não há um confronto de conclusões e certezas acabadas, mas um embate de pressupostos argumentativos na direção de uma síntese resultante da problematização do discurso doxológico construído pelo aluno. Eis o grande mérito da pedagogia freireana e que nenhuma outra apresentou, pois que as outras partem da perspectiva primeira do professor, apenas floreando o bom e velho método tradicional de aula, ainda que não meramente expositivo. Dada a afirmação de que “a anatomia humana é a chave para a anatomia do macaco” (como máxima descritora de uma orientação metodológica) e a crítica vívida de Newton Duarte aos métodos didáticos derivados do construtivismo e às metodologias ativas de aprendizagem, por sua negligência a uma formação ética, política e filosófica diretivas o que, aliás, me parece lícito afirmar e retroalimenta o sistema reafirmando-o, podemos inferir que sua proposição didática assemelha-se ao método tradicional (vertical, unidirecional, linear, transitivo), em que pese sua defesa pela contextualização dos conteúdos e pela crítica severa ao sistema. Precisamos ter em mente que tão importante quanto o conteúdo é a forma em que sua aprendizagem se dá e que um método autoritário irá conduzir à formação de alunos autoritários intelectualmente, reproduzindo, insidiosamente, o autoritarismo do sistema capitalista no interior das escolas e, portanto, na sociedade. É ingenuidade acharmos que essa proposição é mero artifício escolanovista. Enfim, o que me parece é que as teorias educacionais de fundo marxista são uma excelente ferramenta de crítica ao sistema, devendo ser respeitadas e utilizadas como tal, mas são, absurdamente, carentes de um método didático propositivo e concreto, o que se reflete nas palavras da Profa. Kátia (1:50:41): “...se a Pedagogia não está dando conta, não é porque a Pedagogia não tem teoria não, é porque ela tem pouca teoria...a discussão teórica tem que preceder a técnica...primeiro eu preciso entender muito a Pedagogia Histórico-Crítica para [só depois] dar conta da sala de aula...”. Essa pretensa precedência da teoria à prática, desqualificando sua simultaneidade e o entendimento de que, muitas vezes, uma ação prescinde e se antecipa à teoria, convocando-a apenas ‘a posteriori’, é o “tendão de Aquiles” da Pedagogia e uma das responsáveis pela situação que presenciamos no interior das escolas, pois abre espaço para os mais diversos ensaismos didáticos, inclusive àqueles que reproduzem o sistema, sem um compromisso com a formação ética e política do aluno. Para finalizar, a despeito de minhas discordâncias teóricas parciais (pois o Marxismo, a meu ver, é ainda uma referência segura de crítica social, reconhecidas suas limitações), deixo aqui registrado meu profundo respeito e admiração pela trajetória acadêmica e compromisso social e político do Prof. Newton Duarte, entendendo ser substancial sua contribuição para a Educação Brasileira.


quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

MIB: um novo rótulo para a música inteligente brasileira?

Por LAÉRCIO CORRENTINA (Compositor e filósofo)


A música brasileira tem sofrido uma perda irreparável, ao longo dos últimos anos (talvez ao longo dos últimos 20 anos), nos seus conteúdos harmônico, melódico, rítmico e, sobretudo, literário e filosófico. Essa música, quando (e talvez ainda seja) concebida com todos esses pressupostos, era considerada um dos maiores produtos de exportação do Brasil, pois todos os grandes compositores estrangeiros e brasileiros, sem nenhum constrangimento, eram unânimes em afirmar que a nossa música tinha todos os elementos da 'grande música universal', sendo, portanto, riquíssima, exatamente sob o ponto de vista dos pressupostos citados: harmonia, melodia, rítmo e conteúdo literário e filosófico. Estes, segundo os grandes críticos de música ao redor do globo terrestre, dificilmente poderiam ser encontrados - de forma tão simbioticamente artística - em qualquer música pelo resto do mundo.

Atualmente, entretanto, todos esses "ingredientes" têm sido vilipendiados e escornados pela 'indústria fonográfica', em função de propósitos culturais, econômicos e políticos globalizantes. Diante desses objetivos, a 'indústria fonográfica brasileira', que é inerente à 'indústria cultural globalizada', tem a atribuição de designar os ditames estéticos da música que deve ser produzida e difundida por todo o Brasil; sendo tais ditames, necessariamente, portadores de uma ideologia conectada àqueles propósitos. Em consequência de toda esse conluio, a música brasileira tem perdido a sua 'aura artística', algo que não seria nada culturalmente, economicamente e politicamente correto para os fins dessa indústria. Sendo assim, aqueles elementos da nossa música foram integralmente ignorados pela mídia radiofônica e televisiva brasileira, a 'indústria cultural'.

Depois de tudo isso, a música que tem sido produzida no Brasil hoje, e difundida pelos meios de comunicação de massa - e o pior, não expressando nenhuma daquelas bases citadas - reivindica para si (por razões de conveniência marketeira) o rótulo de MPB. Rótulo esse que em tempos remotos compreendia a expressão de uma música absolutamente inteligente e criativa que se produzia no Brasil, em que alguns dos seus maiores representantes eram Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gonzaguinha, Milton Nascimento, Ivan Lins, Sá & Guarabyra, Tom Jobim, Toninho Horta, João Gilberto, Edu Lobo, dentre outros.

Penso que seria muito mais adequado a essa música comercial e desprovida de qualquer atributo artístico, o rótulo de "popularesca", pois o termo "popular", como fora empregado em tempos áureos da cultura brasileira, simbolizava uma música pruduzida espontaneamente pela inteligência e sensibilidade criativas do compositor brasileiro. Era a expressão da mais autêntica subjetividade artística brasileira. E agora perguntamos: cadê tudo aquilo que "era" expresso pela nossa música? Os compositores brasileiros não têm produzido mais nada? E, às vezes, alguns desavisados são até capazes de afirmar: "aquela MPB morreu"; ou "nós estamos vivendo uma época de modernidade na música, o que não admite tendências estéticas muito introspectivas ou críticas". Ou ainda aquelas falácias do tipo: "a MPB tradicional é muito conservadora e não admite novas tendências estéticas". Puro 'senso comum'! E eu interrogo: oh, deuses da música, onde vamos parar por tanta modernidade?! Em razão de tudo isso, é que sugiro que criemos uma nova legenda, que expresse toda a criatividade sensível, perceptiva e artística da nossa música. Enfim, uma legenda que possa ser considerada, autenticamente, a expressão de uma música inteligente brasileira; sendo essa música, ao mesmo tempo, independente de quaisquer amarras, a fim de tentarmos dissipar tanto engano e subserviência. Sugiro que criemos então a MIB: Música Inteligente Brasileira.

Um abraço para os corações estetas!