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domingo, 28 de abril de 2019

A falência anunciada da Educação e o fracasso sindical

Walner Mamede


No contexto brasileiro atual, vemos um desmonte de todo o processo histórico que qualificou, minimamente, a Educação a partir do processo de redemocratização nacional. A atual gestão do Ministério da Educação não reconhece o valor de políticas inclusivas ou distributivas como, por exemplo, o Fundef e seu herdeiro, o Fundeb, ameaçando sua existência por meio dos inúmeros cortes orçamentários prometidos para a Educação, sob o discurso de enxugamento das despesas do Estado. Fazer frente a isso é um papel, não exclusivo, mas sobretudo dos sindicatos. Contudo, existe força e legitimidade dessa instância de negociação, na atual conjuntura política brasileira?

No Brasil, os sindicatos, como instância de negociação, sofreram considerável redução de sua força desde os anos 80, particularmente de meados dos anos 90 em diante. Desde então, gradativamente, os sindicatos têm sido acusados de não serem mais representativos dos interesses da classe ou, mais recentemente, de terem sido cooptados pelas estruturas do Governo, em um ato de “peleguismo”. Isso compromete o poder de barganha próprio dos sindicatos e torna-os suscetíveis às pressões externas, enfraquecendo seu poder de veto aquilo que, em tese, vai contra os interesses da classe que representa. Durante as negociações do Fundef, essa característica foi fundamental para sua rápida aprovação, pois os sindicatos não se constituíram como oposição significativa, seja por sua adesão, seja por sua omissão velada, havendo poucas exceções, como foi o caso de São Paulo, onde houve articulações contrárias em decorrência do entendimento de que seria injusto redistribruir a verba de regiões mais ricas para as mais pobres, por caracterizar uma espécie de parasitismo destas em relação àquelas.

Contudo, ainda que tenha havido focos (esparsos, é verdade) de oposição sindical no Brasil, esta manifestação de poder está muito distante daquela encontrada em outros países latinos, como, por exemplo, no México, onde o sindicalismo possui forças para fazer frente às propostas do Governo Central. Esse enfraquecimento sindical no Brasil não sobreveio gratuitamente e desconexo de interesses. De forma geral a classe patronal possui particular interesse nesse aspecto. Além de ser algo desejável pela “flexibilização” das relações entre patrão e empregado, seu aspecto mais imediato e perceptível, possui o “benefício” de incentivar a instalação de multinacionais em território nacional, haja vista que o capital estrangeiro mantém maior interesse em mercados cujo controle das relações de emprego sejam mais frouxas.

Podemos perceber um paradoxo interessante quando da criação do Fundef: se, de um lado, a força sindical moderada é que preserva a qualidade das relações laborais para seus associados, tornando-as mais justas e exercendo pressões contrárias à exploração de mercado e ao atendimento de interesses particulares, por outro é justamente a crença de que seu enfraquecimento irá criar possibilidades de modernização, aquecimento econômico e expansão do estoque de vagas no mercado, pela redução de custos trabalhistas e pelo aporte de capital estrangeiro não-especulativo, que acabou contribuindo para a rápida aprovação de uma política de equidade (ainda que parcial, pela visão fragmentada da Educação) como foi o Fundef, pois a partir dessa crença foram engendradas estratégias insidiosas a priori que dilapidaram o poder sindical e este não pode fazer frente a pontos cruciais de uma proposta que não conseguia perceber a Educação de forma sistêmica, como caberia a uma política educacional mais equalizadora. A despeito disso, o tempo demonstrou a necessidade de se ampliar o escopo de tal política e o Fundeb foi instituído, abarcando toda a Educação Básica e mais somente o Fundamental.

Inobstantemente, em um momento em que se coloca em xeque a suficiência das fontes orçamentárias e estratégias necessárias para uma maior qualificação da Educação no Brasil, o Governo Federal se posiciona na contramão da evolução das discussões, que se processaram ao longo dos últimos 30 anos, retrocedendo quase meio século nas concepções que alavancaram a Educação no Brasil. O fundamento das oposições vigentes no nível Federal da Administração Pública e suportadas por uma maioria considerável de leigos no assunto, tanto no nível da gestão, quanto no da população, é o de oposição aos pressupostos freireanos, marxistas/comunistas que, segundo eles, "dominaram as escolas e impuseram um modelo de educação doutrinário-ideológico avesso ao seu real papel, que consistiria simplesmente em 'ensinar a ler, escrever e fazer conta'", sendo as disciplinas de humanidades, como Sociologia e Filosofia, desnecessárias e um entrave para tal intento.

Oras, primeiro é necessário se perguntar o que significa "ler" para esses ilustres senhores-leitores-de-Olavo-de-Carvalho, segundo, seria importante ensinar-lhes o que significa marxismo, comunismo e freirianismo (para além da reduzida e deturpada visão olavista), pois é evidente seu entendimento distorcido de tais conceitos, inclusive, é patente seu desconhecimento (ou negligência) da realidade das escolas brasileiras e de sua história, bem como de qualquer fundamento político, pedagógico e psicológico da aprendizagem. No entanto, são eles, com o apoio de 40% da sociedade mais ignorante no assunto e, por isso, seus eleitores, que estão ditando as normas de conduta social e política e, sobretudo, definindo o perfil educacional e profissional e a concepção de cidadania de nossos filhos, netos e bisnetos (quiçá sejam barrados por uma população mais sábia, no futuro, e parem por aí). Se os sindicatos perderam força e a população está completamente descrente acerca de sua própria força de mobilização, seja por sua fragmentação ideológica, seja pelo receio das represálias características dos regimes totalitários, fica a pergunta: como faremos frente a tamanha ignorância e aos estragos que seus portadores estão implementando no cenário nacional?! Os avanços de 30 anos serão jogados por terra em 4, e sua recuperação terá um custo social, político e econômico inimaginável!!!



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